sexta-feira, 10 de junho de 2022

Adivinha - 10 de Junho

 Dia de Portugal

A data 10 de Junho surge anunciada no ano 1880 por um decreto real de D Luís. I que declara a enquanto "Dia de Festa Nacional e de Grande Gala" para comemorar o acontecimento dos 300 anos da presumível data da morte de Luís de Camões, 10 de junho de 1580. 
Durante o Estado Novo a data constituiu uma referência ao patriotismo e ao nacionalismo, incrementando o sentimento na população.


"Há nações que nascem feitas e nações que se fazem.
Portugal é das que se fizeram, contra todos e contra tudo, e nunca teve
sossego nas fronteiras, que chegaram a situar-se nos cinco continentes.
Começou o seu caminho independente nas brumas da pré-história,
dolménico, litoral, magro, debruado por um mar aberto e convidativo, que
navegou desde logo em todas as direcções e transformou mais tarde no palco
de uma das maiores façanhas de que a civilização ocidental se pode orgulhar.
Microcosmo variegado, ora montanhoso, ora ondulado e plano, de cada
miradoiro é inédito e diverso.
Árido aqui, verdejante ali, terroso acolá, passeá-lo é conhecer em miniatura as feições aráveis da Terra.
Sulcado por rios líricos ou dramáticos, consoante o leito, espelha-se neles ao natural o perfil da paisagem.
Um Minho bucólico, uma Estremadura monumental, um Ribatejo toureiro. Invadido sucessivamente por muitos povos, a nenhum se submeteu inteiramente.
Antes pelo contrário, resistiu-lhes a conviver.
Na essência, permaneceu o mesmo, dono e senhor da sua personalidade profunda, livre, visionário,
aventureiro, obstinado.
E sempre cordial.
Quem percorre o país de norte a sul pode queixar-se de tudo, menos dos panoramas e, ainda menos, das gentes.
Austeras em Trás-os-Montes, sóbrias nas Beiras, graves no Alentejo, reservadas no Algarve, identifica-as, no entanto, a mesma índole solícita, prestante, disponível.
Criaturas simples, chegadas ao húmus, tudo nelas tem ainda o sabor saudável do autêntico e primordial.
Na maneira como trabalham, cantam, dançam, rememoram, o observador atento pode descobrir
os sinais vivazes de uma sã tradição rural, comunitária, o vizinho a dar a mão ao vizinho, o velho
a ensinar o novo, o prudente a avisar os incautos.
Marginal à Europa, nem sempre a acompanhou nas suas proezas técnicas e antropotécnicas.
E, nesse capítulo, à primeira vista, pode parecer retrógrado.
Mas essa falsa inércia, esse ilusório sono letárgico, é apenas a paz de boa consciência de
quem conhece o preço de certas cedências ao progresso.
De quem lhe pressente a efemeridade.
No decorrer dos séculos, este povo pacífico, que sempre se soube defender e nunca soube agredir,
aparentemente parado no tempo, foi a própria encarnação do espírito renovador, na tolerância, na
curiosidade, na inventiva.
O primeiro a abolir a pena de morte, a dar a independência a uma das suas maiores colónias,
a dobrar os muitos cabos das Tormentas.
Original na maneira de ser, de sentir e de pensar, a cultura universal deve-lhe um modo específico
de encarar a vida e os valores.
Nos seus Cancioneiros, no seu rifoneiro, no seu artesanato, está documentada uma singularidade
temperamental e intelectual que faz a admiração de quem a conhece.
Todos os viajantes de boa-fé que nos visitaram no passado e nos visitam no presente a testemunham e enaltecem.
Fundadora de novas pátrias, esta pequena pátria, que com os descobrimentos marítimos realizou a
maior epopeia dos tempos modernos, arredondando definitivamente o globo nas mentes coevas,
ainda hoje ajuda a povoar e a unir o orbe, num fluxo emigratório constante.
E é essa vocação planetária, essa inquietação dispersiva que faz do português um peregrino das sete partidas, um cidadão do mundo.
Despido de pruridos raciais, uma vez em terra alheia, miscigena-se, adapta-se, integra-se, mas sem perder nunca os traços nativos. E quando a saudade — um sentimento sem tradução afectiva e vocabular — o crucifica, regressa e retoma, na aldeia de onde saiu, o seu lugar de membro da junta de freguesia ou de mordomo da festa.
Claramente que, ao lado deste Portugal telúrico e arcaico, ainda não desfigurado na alma, escudado na sua castidade moral, existe um outro, contemporâneo do presente, cosmopolita e cultivado, que tem pergaminhos nas artes, nas letras, nas ciências, na política e na religião.
Que erigiu Alcobaça e os Jerónimos, que escreveu Os Lusíadas, que pintou os Painéis de S. Vicente, que comentou Aristóteles e deu à Igreja um Papa e um Doutor.
Mas o Portugal letrado, por muito que tenha feito, não pode, nem de longe, nem de perto, comparar-se ao iletrado, pela tenacidade, pela honradez, pela audácia, pela graça espontânea e pela nobreza de sentimentos.
E que o Portugal eterno, o que nunca traiu, o que dá esperança, é o das revoluções populares, o que trabalha dia e noite sem esmorecer, o que acaba sempre por ter a última palavra nos acontecimentos, o do arado e do remo.
E ele que, anónimo e humilde, não cabe nas crónicas, mas avaliza alguns dos mais significativos passos da história da humanidade."

Miguel Torga, in 'Diário (1988)'





Um castelo, uma antiga bandeira…
Onde fica?

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