sábado, 25 de dezembro de 2021

Árvore de Natal

Uma ilustração de dezembro de 1848, representando a Rainha Victoria, o Príncipe Alberto e os seus filhos admirando a árvore de Natal. Várias variações da imagem começaram a circular, popularizando esta tradição festiva. 

Um pequeno excerto que conta a tradição trazida do Norte pela família Anderson, para a casa do Campo Alegre, atualmente pertencente ao Jardim Botânico do Porto. 

"Era uma festa de mil cores, pantagruélica, ampliada de generosidade que começava no dia em que a tia Teodora ia à mata com o Sezé escolher cuidadosamente qual seria o pinheiro a deitar a baixo para se colocar no cento do átrio do Campo Alegre. A escolha metia sua leitura. Não servia qualquer pinheiro. Tinha de ser alto, pelo menos quatro metros, precisava de uma copa que abrisse lentamente, bem forrado, quantas mais pinhas melhor, tronco não muito avantajado, pruma bem verde para durar até aos Reis quando se levantava arraial daquela praça familiar. [...] Passados dias, geralmente um semana antes da Consoada, Sezé convidava-me para assistir ao bota-abaixo do pinheiro. Chamava o Pereira, pegava na corda de ancorar, como ele dizia, que ficava presa à distância para garantir a queda para um determinada direcção, avisava o Pereira da atenção que era preciso ter para que o pinheiro não partisse nenhum dos ramos. A operação decorria melindrosa e só de pleno êxito quando o pinheiro escolhido ficava titubeante entre os dois outros pinheiros, amparado nas copas que o não deixavam vir a baixo para quebrar. Sezé tratava o pinheiro como um eleito para a festa. Não percebia muito bem porque se venerava tanto um pinheiro que em Santa Cruz do Bispo só servia para lenha e para acalmar o gado, [...] O pinheiro, aquela devoção da árvore, fazia muita confusão ao Sezé. Aqueles metros de pinheiro vibravam uma sensação de verdade pagã que ele ainda não havia descoberto. Contactava um mistério da natureza, arrastava-se a um espírito báltico [...]

    Feita esta operação, o pinheiro assentava-se em cima do carro de bois e caminhava a procissão ao longo da avenida dos plátanos que ligava a mata à parte nobre dos jardins, perto do campo de ténis.  [...] Eu saltava de contente, aquele pinheiro era o Natal, razão máxima de vários dias de alvoroço, [...].

    Assentada aquela estátua vegetal em plena praça pública da família, ficava aguardando que a vestissem, o que demorava quase sempre dois ou três dias, já que os jardineiros tinham de encher de verdura a base do pinheiro e aliviá-lo onde a confusão de ramos não permitisse uma ornamentação a capricho. Depois, as noites passavam-se a enfeitar o pinheiro, trabalho em que todos queriam participar. Havia quem só segurava numa bola colorida e logo desandava sem paciência para mais. Dois escadotes permitiam fazer o trabalho de envergadura, a começar dos altos para o rés-do-chão da árvore, como quem termina o prédio de cidade. [...]

    Primeiro, colocava-se no topo uma estrela grande, como que anunciando a vinda do Redentor. Anos havia em que a estrela era substituída por enorme sino, sino de belém, convocando o mundo para uma nova era. A seguir cobria-se a árvore com uma espiral de prata, rematada na base da copa por um debrum que eu cá em baixo segurava, atento à manobra, enquanto não havia ordem para largar. [...]

    A segunda parte da ornamentação, no dia seguinte ao do prateamento do pinheiro, começava pela suspensão de estrelas, de pássaros de vidro multicolor, de luminosas esferas prateadas boquiabrindo-se em mossas de outra cor, de chocolates em forma de gatos, coelhos, esquilos, bichos de variadas origens. depois seguia-se a vez dos crackers, delícia e delírio de todos que descobriam surpresas ao rebentar o cartuchinho que escondia um chapéu de papel , um assobio de latão ou anel para menina. Tudo era misturado com círculos prateados, mais estrelas, rebuçados em forma de ananás, morango, pêssego , frutas cristalizadas, prendas, carros e, pela primeira vez me lembra, uma avião biplano. Novo brinquedo alemão que espantava pela minucia do construtor. A árvore actualizava-se de simbolismo, verdadeiro conjunto de história enraizada num paganismo cristão sempre em dia com o que de mais importante se passava, em outras terras. Douravam-se nozes, e com paciente trabalho se realizava miniaturas, a tia Teodora vestia de cores bonecos de neve com cachimbo fumegando em algodão, carros puxados a parelhas de oito cães, cabanas protegidas das tempestades de neve por grande defesa de madeira empilhada. Tudo era cuidadosamente mirado, pintado, passado de dedo a dedo numa volta bem requintada, até que a sua voz de já está pronto se fazia transportar para um dos lugares mais vazios da árvore de Natal."

Ruben A.; O Mundo à minha procura.



Imagem retirada da Internet.
Fonte:
https://www.nationalgeographic.com/travel/article/christmas-tree-customs


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