segunda-feira, 28 de março de 2016

20º Presente (3)


"Deslembro incertamente. Meu passado
Não sei quem o viveu. Se eu mesmo fui,
Está confusamente deslembrado
E logo em mim enclausurado flui.
Não sei quem fui nem sou. Ignoro tudo.
Só há de meu o que me vê agora -
O campo verde, natural e mudo
Que um vento que não vejo vago aflora.
Sou tão parado em mim que nem o sinto.
Vejo, e onde [o] vale se ergue para a encosta
Vai meu olhar seguindo o meu instinto
Como quem olha a mesa que está posta."

13-9-1934
Fernando Pessoa; Novas Poesias Inéditas; 116.

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